... nada de fantástico aconteceu hoje - salvo, talvez, uma fantástica enxaqueca. Faz 30º la fora e eu não quero sair de novo. Tenho uma conta pra pagar. Contas são terroristas: elas olham para você, retalham seu organismo de expectativa. É preciso pagar as contas, diria Clarice Lispector, nessa situação. E tudo se transformaria em puro existencialismo. O ovo, a galinha, ou a conta?
Espero sentada.
Tive muitas idéias hoje, idéias para curtas, vocês sabem porque. Porque eu sou doente. Enfim, a primeira grande idéia - me invadiu, mal consigo expressar!, me tomou com uma violência emocionante "sim, é isso", disse a mim mesma, "é a síntese do próprio ser humano", e logo "está vivo!" (sou agora o Dr Frankenstein) - foi fazer um curta sobre o Fagner. Não sobre o Fagner propriamente - que banal! - mas sobre o sonho, a autonomia humana de sonhar, de ir para um show do Fagner. Imaginem a primeira cena:
TELA ESCURA, ENTRA O SOM: ná/ ná ná ná ná ná/ ná ná ná ná ná/ ná ná ná ná ná... Não sei porque insisto tanto em te querer/ se você sempre faz de mim o que bem quer/ ao seu lado, sei tão pouco de você/ é pelos outros que eu sei quem você é...
SOBE O TÍTULO: "Eu sonho com Fagner" [reparem a relação sutil com "I dream with Jeanne", o clássico seriado dos anos setenta]
e, logo: NOITE, NUM BOTECO SUJO: Josefa canta num videoquê o clássico Deslizes, põe toda a sua emoção na música, com o efeito catártico da fina poesia.
JOSEFA: Comecei a gostar de Fagner quando eu era moça, a gente dançava agarradinho com as músicas dele.
MÚSICA: è só assim que eu perdôo os seus deslizes
CRÍTICO LITERÁRIO: Se Pushkin ou Dostoiévski podem ser responsáveis por compreender a alma eslava, Fagner é aquele que conhece a alma brasileira e que a articula com a cultura do seu continente. Com a música "Borbulhas de amor", ele sintetiza a identidade do nosso país, que busca seus fundamentos em seus primos hispanohablantes.
MÚSICA: Tenho um coraçãoo/ Dividido entre a esperança e a paixão/ Tenho um coração/ Bom melhor que não tivera
CRÍTICO LITERÁRIO: Esse desdobramento híbrido de duas culturas, que negam sua síntese, a pesar de buscá-la, é o mesmo articulado por Chico Buarque, ao traduzir músicas como "Iolanda". De fato, Fagner foi celebrado pelas mais distintas vozes no seu tempo, como o caso de Elis Regina, cantando "Mucuripe".
JOSEFA, no videoquê: As velas do Mucuripe/ Vou sair para pescar/ Vou levar as minhas mágoas/ Pra água funda do mar
MARIDO DA JOSEFA: O Fagner enfrenta muito preconceito porque ele é do povo. E música do povo não é boa, né? Os caras acham que não é boa...
JOSEFA: Aquela estrela é dela/ Vida feito vela leva-meeeeeee... daqui!
5 comentários:
Quel, nem tenho o que comentar que eu nunca tenha falado antes!
Mas sabe que você é uma das únicas pessoas que me faz chorar de rir lendo tão poucas linhas né?
=**
ai, que fofo!! to encabulada...
Púshkin é o Fagner russo!
c.
mas o pushkin não tava zoando..?
ele é russo, lili. vai saber!
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