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terça-feira, 19 de agosto de 2014

506: Livrões


                
Nos últimos anos, temas como Testemunho, a relação entre Ficção e História, Autobiografia e Autoficção dão a ideia de que a literatura em espanhol tem habitado os limites da própria literatura. Está confortável em questionar esses limites e se apropriar de novas formas de narrar. Josefina Ludmer chama este movimento de “literatura pós-autônoma”. Mesmo que o termo seja discutível – porque pressupõe uma noção de autonomia pura da arte – podemos enxergar facilmente este esforço em habitar limites no laboratório de autores contemporâneos como Mario Bellatin, Margo Glantz, Tununa Mercado, Tamara Kamenszain, Mario Levrero, Roberto Bolaño, entre muitos outros.
                Mas ao mesmo tempo, numa reação que parece diametralmente oposta, retoma-se também a tradição europeia do romance – não do romance moderno, mas do oitocentista, o romance como forma de conhecimento do mundo, o romance como investigação social, o romance que dá conta da realidade, enfim, o romance total. 2666, de Bolaño, por exemplo, por sua envergadura de mil páginas, por seus detalhes ínfimos, pelo seu narrador onisciente inabalável, pela fé inquebrantável na possibilidade de narrar uma história, nos remete rapidamente ao gesto oitocentista, tolstoniano, da possibilidade de narrar tudo. Guerra e Paz não é um romance histórico para Tolstói, ele é mais do que a própria História. O romance, para o mestre russo, é capaz de penetrar (tudo?), mais profundamente do que a historiografia. É o romance total.
                Só que o romanção hispano-americano do século XXI dá a volta sobre si mesmo . Uma volta diferente da metaficção pós-moderna autofágica, que continha dentro de si sua própria crítica. O romance total hispano-americano do século XXI é um romance colateral, que se perde no próprio assunto, cujo propósito de existir nos passa batido. É um romance sem centro, sem propósito, sem tese, cunhado na estética do tédio.” Un oasis de horror en medio de un desierto de aburrimiento”, é a epígrafe de 2666.
                Melhor do que 2666, o exemplo mais visível desta energia gasta em quase nada é a série La novela luminosa e Discurso vacío, dois romances do escritor uruguaio Mario Levrero. Ao contrário do romance total oitocentista, com seus grandes temas e teses, os romances de Levrero são totais pela meticulosidade verborrágica dos detalhes que não se acumulam em torno de um objetivo.
                "No me interesan los autores que crean laboriosamente sus novelones de cuatrocientas páginas, en base a fichas y a una imaginación disciplinada; sólo transmiten una información vacía, triste, deprimente. Y mentirosa, bajo ese disfraz de naturalismo. Como el famoso Flaubert. Puaj." (p. 72)
                Entretanto, é esse mesmo disfarce de naturalismo que Levrero usa para narrar sua história sobre nada.

                Em suma, a título de panorama da literatura hispano-americana contemporânea, podemos dizer que existe uma corrente do fragmento, da singularidade da experiência, e uma segunda corrente, que talvez seja a mesma corrente, que é a do romance total, em que essa singularidade se alça para o conhecimento do mundo e volta dessa viagem com quase nada nas mãos. É o teatro da pequenez, em Levrero, e a rotina do horror, em 2666. 

terça-feira, 10 de junho de 2014

Sobre Gravando, da Aline Rocha

Esses dias, fui a São Paulo fazer várias coisas burocráticas chatas e de repente eu estava num bar e de repente eu estava já em outro bar e de repente eu estava andando na Paulista de madrugada com uma mochila enorme nas costas e de repente eu estava no karaokê, nostálgica do lugar da onde eu tinha acabado de sair, e de repente eu estava na rua, sozinha, às 4 da manhã, sem ter um lugar pra ficar. Minha experiência morando em SP, apesar de tantos momentos felizes, foi a de um abandono quintessencial. Talvez porque a minha primeira vizinha tenha dito que eu era uma “filha sem mãe” e suspeitava que eu tinha cagado no capacho dela (ainda consigo me lembrar da sua voz dizendo “isso é cocô humano”, enquanto eu tentava colocar algum juízo na cabeça dela); ou então porque minha segunda vizinha tenha me denunciado para a síndica por solicitação; ou porque eu nunca consegui assimilar realmente a experiência que eu estava tendo, finalmente conhecendo o mundo de verdade. São Paulo, pra mim, é um monstro do bem, tipo aqueles do “Where the wild things are”. Mau hálito, barango, assustador, sem limites, divertido. (Ou, para usar a definição de Leandro Rafael Perez, "O pó que nos une é bem mais o da poeira do que o da morte, tu sabe, tudo são monstros" [PEREZ, Leandro Rafael. "Uma leitura levemente acompanhada". Posfácio a PIEROTTI, Marcelo. Domingo no Matadouro. São Paulo: Editora Patuá, 2013.]. De repente, o que assusta é essa intimidade forçada do metrô lotado de encoxadores, que demonstra que todos somos feitos da mesma matéria. Ou ler na plaquinha do ônibus que a lotação máxima são 13 pessoas sentadas e 30 em pé. Aham, com certeza.)

Talvez não seja esta a proposta principal de Gravando, de Aline Rocha, mas seus poemas capturam essa essência paulistana. Note-se a alegria pueril de “About”,

da chuva que cai e não sabemos
da bomba-relógio circular
do drops ardendo a garganta
das voltas que o mundo dá
da billie rouca no ipod
da máquina de refrigerante

formado de versos eneassílabos, imitando as rimas que ensinamos para as crianças. A chuva, o drops (jovem guarda?), a máquina de refrigerante, etc. formam um conjunto harmônico e fofinho – carismático, eu diria – só para romper-se no final. O poema, sem sermão, nos deixa sozinhos, como uma mãe que embala o filho e o entrega pra assistente social, despedindo-se com alguma fórmula batida, tipo “preciso cuidar de mim para poder cuidar de você”. Os dois últimos versos são “de dentro do vagão me despeço/de você na escada rolante”. Adeus, é isso. O poema acaba porque não há possibilidade de reconciliação: o metrô foi embora, nem consigo te ver se afastando no meio de tantas pessoas, mas imagino você subindo pela escada rolante (infinita) cheia de gente a qualquer hora do dia. São Paulo, tem que ser São Paulo, essa mãe sem dó no coração, que no entanto é a única pessoa que te ama de verdade. Só em SP, cai a chuva e você nem sabe, porque experimenta a cidade com os fones de ouvido enterrados nos canais auriculares, ali mesmo mas alheio a tudo que se passa, só interagindo com o absolutamente essencial. SP: bomba relógio circular (como a radial leste e a radial oeste, como as marginais que imprensam a cidade pra dentro do ovo de onde nasceu, como o rio Tietê, retificado à toa, mostrando os limites civilizatórios, o nosso celebrado Rubicão). E sei lá, Aline, de repente você nem teve a intenção, mas esse poema são os amantes que deixamos na estação – antes de termos o celular roubado e perdermos o número deles para sempre. São “as voltas que o mundo dá”, num dia do seu lado, noutro dia completamente indiscernível da multidão. Essa estranha certeza de que nunca vamos nos ver de novo.

SP é também aquela cidade que é tão-grande. Contemplar o seu tamanho – talvez nem tanto o tamanho físico, mas a pretensão, a ambição, o rápido amadurecimento relativo, a população crescente de leões-por-dia, sabe o que é que eu tô falando? Olhar pra isso é quase imediatamente sufocar. É tanto que não dá nem pra reter na memória, como a ansiedade da sua “arquivística” em reter o que leu na semana passada. Gravando é também sobre essas leituras para sempre perdidas, impossíveis de serem recobradas num universo prolífico de símbolos.

Rasgar a página do livro recortar a notícia do jornal
e guardar a posteridade pede notícias que nunca darei
e acreditará em tantas outras notícias que não foram guardadas
(“Rasgando”)

Talvez seja a primeira função da escrita: permanecer. Se permanecer é significar, este eu-lírico está ansiando para que a sua experiência, entre os jornais e as notícias, faça algum sentido, por isso age febrilmente, rasgando e recortando, na esperança de singularizar um momento. (Lembrei do eu-lírico do Rubén Darío, em "Autumnal", pedindo para a fada/musa sempre “Más...” “Más...”, uma angústia pela experiência, pela inspiração). Mas, ainda é SP… Aquela sensação bem distinta de andar entre o exército de executivos da Paulista e caminhar cantando Whitney Huston e ser o contrário da borboleta da física quântica. Não dá nem pra ouvir os próprios passos.

Gravando é também sobre essas frases soltas que a gente ouve na rua “Apareça mais” (de “Visita”), “Tenha cuidado” (de “O sangue”), frases que simulam o acolhimento e a compaixão, mas na verdade são fórmulas vazias da cordialidade entre os pares.

Outros sinais da invasão simbólica da grandiloquente São Paulo: a impossibilidade de sentir saudade (“Entre latinos”), as fantasias com o interior (“Quermesse”), a necessidade de fugir correndo para as montanhas (“A caminho do corpo levitante”), as conversas unilaterais (“Carta para Alcides”), porque você só tem tempo para falar com o namorado enquanto está presa no trânsito, dentro do ônibus com mais dezenas de pessoas que compartilham involuntariamente da sua intimidade. Penso agora que deve ser a mesma sensação de escrever um livro: partilhar sua intimidade com dezenas de pessoas involuntárias. E, de repente, é aí que seu projeto estético, Aline, casa com a minha versão de SP.

A partir dessa relação que estabeleci entre a minha leitura radical e a projeção que eu faço do que seria o projeto do seu livro, vamos a “Este poema foi escrito na cidade de São Paulo” – que, para mim, já começa com um problema estrutural.

Repara: hoje as ruas parecem mais calmas.
Não quietas, veja bem, não nesse sentido: mas
Parece que todos desceram na estação exata.

Impossível!!!!!(veja quantas exclamações)!!!! Enquanto escrevo isso, neste exato momento, os metroviários estão em greve, a cidade está no estado de armagedon para qual os paulistanos, filhos do apocalipse, já nasceram preparados e o Sr. Governador Geraldo Alckmin já mandou avisar que quer que todo mundo vá tomar no cu e vai, ele mesmo, passear por aí de helicóptero, como se fosse um correspondente de guerra. SP é assim: ame-a ou deixe-a, ninguém te quer aqui. Dessa forma, o poema na verdade descreve um ambiente idílico, o último milagre, em que exatamente TODAS as pessoas descem na estação “exata”. Veja bem, não é a estação “correta”, ou “desejada”, é a estação “exata”, de uma alta precisão matemática, desenhada no google maps por uma calculadora científica. Nem o GPS errou: você está onde você deveria estar. Você não se perdeu na cidade e de repente ficou sem lugar pra dormir às 4 da manhã. Não. Você está onde deveria estar. Nem você sabia pra onde ia, mas você chegou, é ali. Ao contrário do adeus terrível de “About”, temos um “olá” amistoso, acolhedor. É a evasão mais completa da realidade e dá a SP algo que ela nunca teve: carinho. (Não, brincadeira, tô exagerando. Não me matem, paulistanos.) Exatidão matemática: daí o teu desejo obsessivo pelas ruas retilíneas (pressinto um desejo de se mudar pra Brasília).

Para você, Aline, matemática é amor. Deduz um dente em “Abertos 24 horas”, faz uma contagem regressiva pra viajar em “Não me fotografe, me beije”, vai adicionando cigarros em “Assombração urbana”, deduz 23 anos de 30 metros quadrados em “A prece”. Toda poesia matemática lembra Trilce, um cálculo infernal, uma lógica profana para tratar os sentimentos. Transformar experiências e sensações em contas impossíveis, em números delirantes como o próprio trilce: mais uma possibilidade poética descoberta. Elevar a poesia à potência zero, admitir que existe algo fora dos limites da aritmética, fora da lógica. Admitir que existe amor.

E tem as homenagens, reais ou imaginadas por mim. Vejo “Quadrilha” em “A queda” (de Hitler? É uma referência ao filme?).

A primeira a atirar-se foi Leandra
Logo depois Sansão e em seguida os gêmeos.

Só que em vez de Maria amar João e sei lá mais quem, é a Leandra e o Sansão e uma fila que se joga de um prédio. O suicídio surreal corta a casa – novamente essa ideia de lar desfeito, de solidão absoluta, de falta de origem, de exílio em si.

Antes, porém, cortaram os fios de eletricidade
Cortaram todos os fios de todos os eletrodomésticos
cortaram os cabelos uns dos outros
desfiaram a colcha de Penélope
romperam a ponta do novelo de Teseu
passaram gilete nos pelos pubianos
e decoraram a biografia de Rimbaud

Os fios de eletricidade (que decapitariam os corpos em queda livre), os fios dos eletrodomésticos (o rompimento da harmonia doméstica) (como o Ian Curtis, pendurado na corda do varal, esperando ser encontrado pela esposa traída e pela filha neném), cortando os cabelos uns dos outros (um ritual de esterilização e impotência, afinal um deles chama Sansão), a gilete (o clássico suicida, como Guerra e Paz), Penélope e Teseu (das aulas de literatura clássica que agora jazem no mais profundo e inacessível do meu cérebro) e decorar Rimbaud como quem precisa fazer um curso introdutório para deixar-se cair do prédio. Deste poema, o mais estranho verso é “a parte mais triste era a volta”, como se fosse um ensaio de queda, ou como (para usar a metáfora que o livro oferece) fosse um vídeo visto de trás para frente, freneticamente, um suicídio ao contrário, “num ritual de Ícaro”.

Ainda no assunto das homenagens, em “Córdoba”

Quando chega a noite, sento em minha cama a observar as intimidades [vizinhas
mas não há ninguém, apenas uma luz amarelada de um abajur do [século XIX.
Imagino que a velha senhora
(por que velha, meu deus? Existem também freiras jovens, joviais)
esteja lendo um dos livros proibidos pela Inquisição.

para mim, é uma celebração do Grupo XIX de teatro, encenando grandes sucessos oitocentistas pelas ruas de SP, fazendo convergir o finissecular e o contemporâneo a ponto de você questionar seu tempo-espaço. Também é uma homenagem que eu faço ao meu vizinho do 9º andar.

Outra homenagem é uma previsão bizarra da morte de Gabriel García Márquez, em “Sobre a versificação”. Não sei o que dizer sobre poetas com habilidades paranormais.
E, finalmente, em “Lentes”

A sua fotografia me olha
com olhos que adivinham
minha imagem

Eu vejo a sua fotografia
e vejo meu reflexo
nos óculos escuros

 uma homenagem a Ana Cristina Cesar e seus óculos escuros estampados para sempre na capa rosa choque da Companhia das Letras (John Hughes?).



 Na verdade, acho que é próprio de fotografias de escritores o fato de nos perseguirem da capa do livro para a vida real. Já escrevi, em outro lugar, sobre os pesadelos que tive com oRoberto Bolaño, magrelo e doente, seus olhos fixos em mim pra onde quer que eu fosse. A fumaça do seu cigarro tomando o ambiente, embaçando os contornos dos livros no stand. Esses são “os olhos que adivinham/minha imagem”, os olhos mais poderosos esses dos nossos ídolos mortos.

Poderia escrever sobre a metáfora sugerida pelo projeto gráfico do livro, uma relação entre a linguagem da Aline e o kitsch, o cinema – que no final é essa vida vivida pelos olhos dos outros, simulada, nunca experimentada. Que no final é nosso desejo de ficar em casa, assistindo The Apartment pela décima quarta vez, em vez de nos jogarmos na rua, conhecermos gente potencialmente idiota com uma tatuagem do Corinthians, descermos na estação errada e talvez de repente ficarmos sozinhos na rua às 4 da manhã sem ter um lugar pra dormir. Esse é o contraste mais importante, a saber, as experiências ativas que os poemas sugerem e a concepção do livro em torno de um ambiente simulado. Mas não vou falar sobre isso porque não sou obrigada (“Eu não sou obrigada”).


A arte de escrever resenhas e prefácios é isso: a arte de discorrer sobre um livro fingindo que foi você quem o escreveu. 

terça-feira, 3 de junho de 2014

posts inacabados vol 1: tolstói (claro)


As pessoas acham que desisti desse blogue. Intrigas! Ando escrevendo, e muito. Mas terminar as coisas, de repente, pareceu muito difícil.

Pensando nisso, vou inaugurar uma série de posts inacabados que tenho guardados do meu computador. Gostaria de dedicar esse esforço de continuidade à amiga/leitora Kelly Marques, pelo seu apoio moral/incondicional/cafeinístico.

Esse é o começo de um texto sobre Guerra e Paz, frustrado por um artigo na Gazeta Russa que falava quase a mesma coisa. Réquiem para o ensaio...

Este artigo se baseia metodologicamente numa ignorância profunda sobre a literatura russa e sua respectiva sociedade e, segundamente, em uma excitação igualmente profunda pela obra literária de Liev Tolstói.
 Quando falamos que tal escritor inspirou uma “multidão” de fãs, ou que reuniu um “culto”, comumente estamos usando essas expressões em sentido figurado. Não com Tolstoi. Se nos livros de História da literatura, você vir escrito que Tolstoi formou uma seita, entenda com o sentido literal de religião. O tolstoísmo está aí para nos lembrar que a literatura já foi responsável pela mobilização política e espiritual (?) da sociedade, um estremecimento das bases morais do "eu" que pode causar revoluções. Também nos faz lembrar que esta mesma instituição, a saber, a literatura, encontrou o seu auge mais culminante justamente no século XIX, quando a sua influência era muito maior do que qualquer outro tipo de mídia. (Não era uma época multimídia, como hoje. Seria monomídia, talvez, em que o meio impresso dominava completamente a opinião pública.)
 Será que conseguimos imaginar o sucesso de Tolstoi? A discussão que Guerra e Paz movimentou nas ruas, a cada volume? Teremos como perceber a total dimensão, em termos de público, da influência dos seus escritos?

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Undesirable - uma crônica para J. M. Coetzee



Na quinta-feira, 18 de abril, o Salão de Atos da UFGRS estava fervilhando com pessoas bem-vestidas do meio artístico, que são facilmente reconhecidas por seus cortes de cabelo, sapatos despojadamente sociais e óculos muito maiores que seus rostos. Nós éramos poucos, do lado de fora, atrasados para a palestra que começaria às 19h30. O auditório estava meio cheio, ou meio vazio, depende da inclinação política da pessoa, e a função começou levemente atrasada. O clima era solene: John Maxwell Coetzee foi apresentado pelo vice-reitor na universidade, que reiterava muitas vezes a honra de recebermos um prêmio Nobel, etc e tal.

Existe uma diferença no ar de se estar na presença de um Nobel. É como estar obrigado a reconhecer que se está em um momento histórico. Um Nobel é como um busto ainda não esculpido, uma estátua por vir, um memorial por se erguer, uma escola por se batizar. Coetzee entrou no palco como se soubesse disso, um pouco acanhado, um pouco constrangido pelo tamanho do barulho que causava, como alguém que entra num quarto, pé ante pé, sem querer ser percebido. Sua postura não parecia casual, se pensada no seu contexto: o tema da palestra era a censura, especialmente, como ele mesmo introduzia, a censura pela parte do governo sul-africano dos seus primeiros livros. Ele explicava, com sua voz assustadoramente clara de fita de aula de inglês, que teve a oportunidade de ler os relatórios dos censores destes livros – os quais, vocês imaginarão, seguramente tratavam de temas polêmicos, moralmente questionáveis e politicamente radicais desde uma perspectiva altamente ambígua. Apesar disto, os censores eram unânimes na opinião de que as obras não eram undesirable, indesejáveis, o código dos censores para obras que deveriam ser banidas. O argumento seria que estes assuntos espinhosos eram menores, principalmente se comparados à riqueza estética dos livros. No meu canto, eu pensava histericamente como deveria ser horrível ter agradado um censor! Todos frisavam: estes livros não deveriam ser banidos, porque foram feitos para um público muito pequeno de homens e mulheres bem letrados – e que, portanto, concluía o Nobel, não eram capazes de causar revoluções. Só os textos populares seriam capazes de despertar nas massas o desejo de se rebelarem, um desejo imediato e radical, não acessível aos livros de alto rigor estético. Coetzee perguntava que tipo de relação entre literatura e política faziam esses censores. Por outro lado, o que essas pessoas, professores de faculdade, escritores como ele, vizinhos pensavam que estavam fazendo? Salvando grandes livros da fúria ignorante de um regime opressor – Coetzee citava o censor-herói de Púchkin e eu via aquele personagem do filme alemão A vida dos outros –, pensando secretamente que, se não fossem eles os censores, seriam outros, outros menos sensíveis, convencidos do papel do Estado no desenvolvimento das artes.

A palestra concluía, com a voz poderosamente clara de Coetzee, uma voz que poderia facilmente ser de aforismos, que nenhuma censura é heroica, que todas refletem o julgamento moral das sociedades que as criam – seja censurando literatura, seja pedofilia. Saímos do salão de atos, do solene salão de atos, depois da nossa participação irrevogável do transcurso da História, com o mesmo nó na garganta, a mesma sensação de contrariedade que temos ao terminar um livro de Coetzee. Estranhamente, sem nada a dizer.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

a preguiça da metáfora


Hoje eu tinha uma metáfora muito boa para a literatura. A literatura era como um carro, tinha várias marcas. 

Não, não era isso. Deixa eu tentar lembrar... O que eu fiz hoje que poderia ter me inspirado? Comprei um fatiador de queijo. A literatura é como trabalho doméstico, nunca acaba e nunca é o suficiente.

Não, não era isso. O que mais eu fiz hoje? Descobri uma praga de ácaros no armário da cozinha. A literatura é como um pesticida, nunca funciona como você espera e deixa o ambiente fedendo. Não. A literatura é como telemarketing, incomoda e nunca diz o que você queria ouvir. Não, podre. Que tal: a literatura é como rinite alérgica, você nunca vai convencer o médico a te dar um remédio que efetivamente funcione. 

Não, não era nada disso.

Literatura é como amnésia.

terça-feira, 5 de junho de 2012

da capa à contracapa


HOJE EU ACORDEI pensando uma coisa bem besta. Que o ser humano é  um animal essencialmente paradoxal (olha, rimou): por um lado ele precisa viver em sociedade, constrói ponte, etc; mas tem que carregar dentro de si essa imensa solidão e a certeza de que tem algo dentro de si que é incomunicável.

A maioria das atividades humanas advém da primeira característica: a política, a engenharia, a música, o sexo, a astrologia, a escalada... Todas feitas a partir da magia da integração das pessoas a fim de fomentar, exatamente, essa mesma magia. Como um moto-contínuo. Não me leve a mal, não estou dizendo que a música não depende de uma etapa de criação, em que a pessoa tem que sentar sozinha no piano e arrancar as coisas de dentro de si, etc. Mas, para que serve a música? Num sentido bem figurado, aquelas centenas de pessoas que vão assistir a um concerto, todas juntas, ouvindo versões da mesma música filtrada pelos seus ouvidos danificados pelos sons da grande cidade. Ou aquela meia dúzia de pessoas, no aniversário da Cláudia, ouvindo pagode e dançando. Ou a música que toca quando a noiva entra no altar. Coletividade, Zeitgeist, catarse coletiva. Dá para se responder à música, dá para dançar ao som dela, ou vaiá-la.

Mas a literatura se alimenta da segunda característica. Diferentemente do músico, depois do momento de criação -- todos aqueles anos na frente do computador -- o resultado é uma obra que só pode ser fruída individualmente. Claro que você pode adaptar um livro para o cinema, ou lê-lo em voz alta, ou escrever uma peça, etc. Mas o livro-livro é destinado para uma fruição individual. Segundo o crítico argentino Damián Tabarovsky

"Se há algo que se opõe à literatura é a argumentação. A literatura é o que acontece agora, neste mesmo instante, o que advém irremediavelmente, e a experiência literária é a experiência desta ausência, da linguagem desbocada e nossa própria solidão. Solidão que é da própria obra. A obra não é afirmação, não é positividade, não é construção: ao contrário, a obra é um parêntese, a suspensão do mundo. A obra não dá sentido, o retira. Não gesta, ao contrário, a obra é a materialização sensível da anulação do mundo: a obra suspende." (p. 90)

Bom, não era exatamente isso que eu queria dizer.

PS: Este tumblr é muito legal.

terça-feira, 22 de maio de 2012

pó de diamante

ESSE MÊS, comecei a ler o calhamaço fatídico, 2666, do Roberto Bolaño. meus parentes dizem "aquele dicionário que a Raquel tá lendo". minha mãe disse "esse livro é do seu autor?" ("meu" autor?!) "é... sim, é praticamente seu, de tudo o que você escreveu sobre ele".

meu.

é estranha essa vocação imperialista da crítica. você estuda o autor e ele é seu. o tema é seu. aos poucos, nós vamos setorizando e absorvendo todas as áreas de conhecimento -- na velha técnica de resumo e catalogação de temas e autores-- até que tudo seja nosso. tudo. uma parte é minha, posso responder por ela, dizer o que está certo e o que está errado, escrever infinitamente sobre ela (repetindo alguns parágrafos, deslocando algumas expressões, etc.), até poder responder pelo autor. imagina, Roberto Bolaño nunca diria isso, inclusive, no parágrafo nove da página 796 de 2666, ele afirma o contrário. e quando o acusarem de alguma coisa, homofóbico, por exemplo, eu sempre poderei defendê-lo, até ele parecer uma daquelas entidades inatingíveis -- como você OUSA dizer isso?-- e nunca mais ninguém vai poder ter uma opinião respeitável sobre sua obra se não tiver lido tantos livros quanto eu.

quando na verdade, no silêncio da noite, quando a leitura parece o que ela realmente é, essa atividade fatalmente solitária, você encara o livro e sabe, e tem certeza absoluta, que o momento de tê-lo nas mãos, de transforma-lo em um discurso próprio, é o mesmo momento que ele não existe mais.

terça-feira, 15 de maio de 2012

el acto de escribir

AO SENSIBILIZAR-SE pelo meu atual estado pouco criativo (para quem não sabe, tenho menos de um mês para depositar minha dissertação), um amigo me enviou isto:

El acto de escribir puede abordarse con nerviosismo, entusiasmo, esperanza y hasta desesperación (cuando intuyes que no podrás poner por escrito todo lo que tienes en la cabeza y el corazón). Se puede encarar la página en blanco apretando los puños y entornando los ojos, con ganas de repartir ostias y poner nombres y apellidos, o porque quieres que se case contigo una chica, o por ganas de cambiar el mundo. Todo es lícito mientras no se tome a la ligera. Repito: no hay que abordar la página en blanco a la ligera.
No te pido que lo hagas con reverencia, ni sin sentido crítico. Tampoco pretendo que haya que ser políticamente correcto o dejar aparcado el humor (¡ojalá tengas!). No es ningún concurso de popularidad, ni las olimpiadas de la moral; tampoco es ninguna iglesia, pero joder, se trata de escribir, no de lavar el coche o ponerse rímel. Si eres capaz de tomártelo en serio, hablaremos. Si no puedes, o no quieres, cierra el libro y dedícate a otra cosa.
Bataille? Ricardo Piglia? Bolaño? Borges? Não. Stephen King, para demonstrar, mais uma vez, os perigos de passarmos batido por certas coisas por puro preconceito...

terça-feira, 1 de maio de 2012

primeiro de maio

HOJE É DIA do trabalho, ironicamente também é feriado. aí eu pensei imediatamente numa citação do Georges Bataille, na única entrevista concedida pela televisão (graciosamente traduzida para o português por aqui). Diz o francês: "Escrever é o oposto de trabalhar. Isso pode não parecer lógico, mas mesmo assim, todos os livros interessantes são esforços que caminharam contra a noção formal de trabalho."
Isso me fez pensar um pouco, isso porque a seguir ele acrescenta um exemplo:
"[Kafka] pensava que quando escrevia estava agindo contra os desejos de sua família e, portanto, ele se colocou numa posição de culpado. É fato que a sua família disse de todas as formas que era errado passar a vida escrevendo, que a coisa certa a se fazer era dedicar seus esforços em atividades comerciais e, se ele fizesse qualquer coisa diferente, estaria do lado do mal."
Eu me lembro muito bem desse momento em Kafka -- não sou uma grande leitora dele, mas é muito difícil não ficar emocionada com Carta ao Pai. Tente você não se emocionar



Para você a questão sempre se apresentou em termos muito simples, pelo menos considerando o que falou na minha presença e, indiscriminadamente, na de muitos outros. Para você as coisas pareciam ser mais ou menos assim:trabalhou duro a vida toda, sacrificou tudo pelos filhos, especialmente por mim, e graças a isso eu vivi "à larga", desfrutei de inteira liberdade para estudar o que queria, não precisei ter qualquer preocupação com o meu sustento e portanto nenhuma preocupação; em troca você não exigiu gratidão você conhece a "gratidão dos filhos" mas pelo menos alguma coisa de volta, algum sinal de simpatia; ao invés disse sempre me escondi de você, no meu quarto, com meus livros, com amigos malucos, com idéias extravagantes, nunca falei abertamente com você, no templo não ficava a seu lado, nunca o visitei em Franzensbad, aliás nunca tive sentido de família, não dei atenção à loja nem aos seus outros negócios, a fábrica eu deixei nas suas costas e depois o abandonei (...). Se você fizesse um resumo do que pensa de mim, o resultado seria que na verdade não me censura de nada abertamente indecoroso ou mau (exceto talvez meu último projeto de casamento), mas sim de frieza, estranheza, ingratidão. E de fato você me recrimina por isso como se fosse culpa minha, como se por acaso eu tivesse podido, com uma virada do volante, conduzir tudo para outra direção, ao passo que você não tem a mínima culpa, a não ser talvez o fato de ter sido bom demais para mim.
Conseguiu?


Enfim, há muita literatura sobre como escritores e críticos desprezam o trabalho formal e há pouca que deixe claro o quanto este movimento é uma resposta às condições de trabalho dessas próprias pessoas. Escrever não é trabalhar, segundo alguns, porque a maior parte do tempo você fica olhando para o computador, disperso, almoçando com os amigos, lendo, etc. Porque há uma renúncia da forma de vida que o resto das pessoas adotou para si, com vários riscos reais e imaginários -- o que não faz deste ofício, na verdade, realmente diferente dos outros, vide o Murakami.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

reflexões à pia da cozinha

EU TENDO A ser pouco inspirada por escritoras mulheres. É uma coisa triste de se admitir, na verdade. Não porque elas sejam mulheres, pelo amor de deus. Mas porque existe alguma coisa que não me convence na escrita da maioria delas (estava pensando nisso enquanto lavava a louça, que clichê).

Eu gosto de poucas escritoras, principalmente brasileiras. Clarice Lispector, óbvio, mas mais pelo valor histórico na minha vida, como na de qualquer outro adolescente brasileiro. Eu passava mal lendo os livros dela, pensando em existir, pensando em coisas que a gente não pensa. Acho que Clarice é uma porta para outras drogas: assim que você aprende a ler os livros dela como devem ser lidos, com cuidado, sofridos, lentos, você aprende a ler.

Ana Cristina Cézar, honesta como o diabo, cutucadora de feridas. Ela não se contenta com as palavras bonitas ou com a sintaxe elaborada e paradoxal (como a Lispector). Tem uma sinceridade daquelas que é soco no estômago e simples, simples ao mesmo tempo.

Acho que de brasileiras é só. Gosto da Lygia Fagundes Telles, mas não tenho tanto interesse. Não me inspira.

(Não quero dizer que essas pessoas são boas e outras são ruins, não vou citar a Virgina Woolf, que é uma senhora escritora, mas que também não me inspira. Me faz lembrar a Clarice Lispector, ainda que seja o contrário, mas eu li Clarice primeiro, não dá mais pra mudar a ordem dos fatores.)

Ursula le Guin, dama da ficção científica. Adoro como os planetas dela têm questões de gênero, mas também de exílio.

Agatha Christie, dama da literatura policial, uma velhinha extremamente produtiva. Eu penso mais nela como uma pessoa intimamente perturbada, que precisava escrever compulsivamente pra se sentir feliz.

E só. O fato de eu ter parado 2 minutos pra pensar e não sair nada é muito significativo. Mais do que eu voltar para a minha estante e procurar por omissões constrangedoras.

E agora é a hora da explicação aleatória que não tem nada de científica.

Eu acho que sou de uma tradição de leitores extremamente desconfiada da palavra escrita. Que, de forma geral, não aceita a palavra bonita, a sintaxe poética, o uso da segunda pessoa do plural para criar uma instância ficcional elevada. Existe algo de pernicioso aí, diz o meu intelecto aceso. São armadilhas que podem desviar da verdade, como red herrings, pistas falsas (mal traduzidos como "arenques vermelhos"). E, de forma geral, existem poucas mulheres escritoras (que o meu humilde recorte do mundo tenha convivido) que não sejam abarrotadas, dramáticas.

terça-feira, 10 de abril de 2012

um estudo sobre o verso

pouca gente sabe,mas nesses tempos de modernismo tardio e revolta contra a lírica, o exemplo mais modelar de escansão e melodia poética estão numa música do gian e giovanni:

/O /tem/po/ pa/ssou /e/ eu /so/fri/ ca/lado
/Não/ deu/ pra/ ti/rar/ e/la/ do/ pen/sa/mento
/Eu/ ia/ di/zer/ que/ es/ta/va a/pai/xo/nado
Rece/bi o/ con/vi/te/ do/ seu/ ca/sa/mento
/Com/ le/tras/ dou/ra/das/ num/ pa/pel/ bo/nito
Cho/rei/ de e/mo/ção/ quan/do a/ca/bei/ de/ ler

Pra quem não manja de escansão, a primeira estrofe tem 11 sílabas em cada verso, como a Eneida, é chamado de verso heróico, porque é o usado pelas epopeias, ou seja, a forma que encontraram de traduzir para o português o decassílabo dáctilo do grego antigo. Vocês também perceberão que o pé do verso, marcado em itálico, cai exatamente no meio, em todos os versos. Como Camões, que o leitor certamente relembrará

Cantando espalharei por toda parte,Se a tanto me ajudar o engenho e arte.


Podemos, portanto, que Gian e Giovanni são neoclássicos pós modernos, inspirados na grande lírica grega e, posteriormente, romana, e que sua leitura de Os Lusíadas foi altamente inspirada.

domingo, 8 de abril de 2012

literatura e solidão


UMA COISA QUE tipicamente aflige o/a crítico/a literário/a é a sensação que o/a acomete de tempos em tempos de que o que ele/a faz não faz o menor sentido. Isso é um lugar comum que muitas vezes faz aquele que se dedica a pensar a literatura a simplesmente desistir. Pra que serve o que eu faço?

O que a gente não percebe é que essa pergunta também é característica do crítico literário. O pedreiro se pergunta por que faz o que faz? O motorista de ônibus? O biólogo, o físico, o pedagogo? O catador de lixo? O politólogo? O dono de loja de ferragem? O economista? O piloto de fómula 1? O técnico de som?A babá? Não. Pouco importa se a profissão tem ou não a ver com estudo, em geral os profissionais não se colocam em uma posição para dizer que seu trabalho é inútil, ou que não vale a pena fazer o que faz. Então, a primeira pergunta que deveríamos fazer é: a que demanda estou respondendo ao tentar encontrar a razão de ser do que eu faço? -- e a resposta é só uma, a demanda de alguém que acha que pensar em literatura é uma coisa inútil.

Marcos Siscar, professor da Unicamp, argumenta que, para esse vazio, os críticos começaram a responder criando uma espécie de crise da literatura (fomentados, é claro, pelas mudanças no suporte e no público ao longo do tempo). Assim, a literatura sempre precisa ser salva do seu futuro desaparecimento, sua morte anunciada, seu apocalipse, e os únicos que podem salvá-la são os críticos. Daí a importância do seu trabalho. Além disso, o apocalipse da literatura também é uma forma, ainda segundo Siscar, de assegurar uma crítica literária que esteja sempre comprometida com o questionamento, a ruptura, o senso crítico. De alguma forma, então, a literatura ganha sentido, uma certa urgência, sempre que se encontra, de foma clara, no limite. O habitat da literatura sempre é a beira do abismo, o fundo do poço (ou pelo menos de uma certa literatura, ou melhor, da literatura pensada pela lente da crítica literária).

E ainda tem os agravantes: a alta burocratização da academia, que nos leva a passar a maior parte do tempo fazendo coisas, essas sim, completamente inúteis, preenchendo formulários, cumprindo prazos absurdos, etc. Mas talvez o maior agravante seja o fato de que a maior parte do que a gente faz -- ler, escrever, comentar livros, fichamentos, anotações, correções e revisões -- são atividades profundamente solitárias. Você pode passar o dia, o dia inteiro, sem dar bom-dia para ninguém e, de uma forma menos literal, passar a maior parte do tempo sem ter alguém com quem você possa compartilhar seus pensamentos. Aos poucos, a coisa vai ficando cada vez mais específica, especializada e solitária.

A imagem do crítico literário é o homem (ou a mulher) sozinho com sua caneca enorme de café, segurando um livro de 2.000 páginas com um braço só, de pijama o dia inteiro -- uma imagem muito parecida com a de um adolescente jogando guitar hero.

terça-feira, 27 de março de 2012

uma história de piratas

NAQUELA ÉPOCA, já era comum sair e conquistar o mundo. Qualquer pessoa poderia fazê-lo. Era só chegar, ensaiar o rito da pedra originária e escrever o nome na árvore. Mas também não significava nada: ser senhor do universo envolvia muitas contas pra pagar e nenhuma autonomia. Não é fácil governar súditos naturalmente anarquistas, uma nação de piratas.

Eu mesmo já fui pirata, não é nada demais, só dá bastante chulé.

(jan/ 2010)

segunda-feira, 5 de março de 2012

saga

Esta história deveria ser uma saga em 7 volumes, tipo O tempo e o vento. Mas, como a autora sou eu, e eu sou incapaz de escrever mais de algumas linhas antes de arrematar a história com um final inusitado e um pouco apressado, este vai ser mais um daqueles posts curtos.


Eu sou de uma família só de mulheres. Mesmo que não fosse, os homens pareceriam pequenos na frente dessas mulheres que decidem o fim e o começo do mundo. Que decidem o que está certo e o que está errado. Que reunem todas as histórias do universo, nada escapa delas, como um narrador onisciente. Os homens só aparecem, no fundo do plano, põem comida na mesa e saem de foco.


Se você é um hóspede, ou uma visita -- como você é agora, aqui, neste blogue -- não se atreva a ajudar. As mulheres da minha família detestam quando as pessoas se sentem à vontade no universo delas. Não lave a louça, não se levante. Deixe que elas rejam o universo. Qualquer atitude ao contrário vai desafiar a soberania delas, vai deslegitimar o poder absoluto que elas têm sobre todas as coisas.


Outra coisa: você não vai poder ir embora. É como Hotel California. Se você não virar um zumbi, ou mais um homem fora de foco, vai ter sido atado, mãos e pés. Pescoço, cabelo, olhos, joelhos...


Coração.

domingo, 13 de novembro de 2011

telefone sem fio


e resolvi me castigar na última viagem. Minhas coisas sempre têm a ver com recompensa ou castigo, ainda me trato como uma menina de 5 anos. Nem tanto para me punir, na maioria das vezes para me ajudar a reconhecer quando faço alguma coisa boa, ou extraordinária. Me puni: sem caneta nem papel. Nunca tinha percebido assim, na pele, a compulsão que tenho por escrever. Escrever QUALQUER coisa.

Ultimamente, comecei a fazer listas. Onze coisas que eu detesto. Cinco pratos que aprendi a fazer e gosto muito. Três piores anos da minha vida. Sete piores foras que uma pessoa pode levar. Cinco melhores filmes do Brad Pitt.

De repente, isso chegue um dia a um conhecimento singular de mundo, não sei. Não me importo, na verdade. Nem tudo o que a gente faz tem que ter um objetivo. Viver mesmo, como atividade humana, não tem um objetivo, nem, sei lá, ser feliz. Dançar. Bater bola. As pessoas continuam fazendo isso indiscriminadamente, mas escrever, por algum motivo obscuro tem que ser sofrido, tem que fazer as pessoas sentirem.

Escrever não precisa ter um objetivo específico, uma obrigação no universo. Pode simplesmente ter uma função desopilante, por exemplo. Não digo de uma forma freudiana, mas como uma maneira muito simples de organizar ideias, comunicar, passar o tempo. Como fazer crochê. Como passar horas no facebook curtindo foto de gatinho.

Ler é bom. É uma das poucas atividades que pode vir a fazer o seu cérebro desligar e estar à deriva. Uma deriva totalmente indiscriminada, aliás, você pode ler horóscopo, Thomas Mann, Sabrina (com cenas picantes), relatório de remessa de pinos de joelho, Turma da Mônica Jovem. Você pode inclusive ler tudo isso junto, num dia só, entre pausas no trabalho e idas ao banheiro. Conheci um cara que leu O Discurso sobre o Método no banheiro, não entendi o apelo, mas aí vai da pessoa…

Gosto de escrever umas frases soltas que as pessoas falam por aí. Comecei a fazer isso depois que troquei uma ideia, que chique, com o Chico Alvim, na casa dele, em Brasília. Ele me disse pra ler a poesia dele como se fosse uma pessoa falando no telefone, sem ouvir a resposta da outra.

Comecei um caderno com uma frase de uma palestra (ou de um livro) do Sergio Ciancaglini, um jornalista argentino. Ele falava de experiências portadoras de futuro (está escrito com uma caneta cinza, bem no topo da primeira página da minha caderneta, entre aspas). Agora que eu escrevi essa frase neste texto, fico pensando que todos os textos são experiências portadoras de futuro.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

trem



Antes de chegar em Buenos Aires no primeiro dia da primavera, tinha tido um sonho estranho em que uma das minhas amigas que agora mora lá me dizia, com alguma desdém, “Buenos Aires já não é mais como você se lembra”. 4 anos distavam este sonho da minha última visita à cidade, da qual eu já guardava uma imagem distante, de forma que o aviso fazia algum sentido.



No sonho, eu descia do desconhecido Aeroparque e caminhava pela cidade, pelas largas calçadas que eu lembrava tão bem e via anúncios escritos em português. Na tentativa de finalmente treinar meu espanhol enferrujado, recebia uma represária de um portenho: “mas a boluda não sabe que agora em Argentina se fala português? “ A boluda não sabia e pediu desculpas. Na verdade, veio a notar rapidamente que não falavam português. Era um português língua segunda, um espanhol traduzido toscamente, em que as indissincrasias típicas do portenhês se mantiam, estóicas. (Acho que estoica não tem mais acento).



Na vida real, desci do aeroporto desconhecido Aeroparque e tomei um taxi com a minha amiga. Com certo alívio disfarçado verifiquei que o motorista falava espanhol. Mas do outro lado da calçada, os bosques de Palermo, a biblioteca nacional, alguma coisa faltava. Só fui entender depois de meia dúzia de interações comerciais que me disseram o que aconteceu enquanto eu estava longe: a Argentina quebrou. De vez. Um brasileiro lá é uma espécie de novo rico, como a Kathy Bates no Titanic. A gente esconde dinheiro no fogão e depois acende o forno.



Não foi uma descoberta brilhante, as pessoas têm me descrito exatamente o mesmo quando vão visitar a Argentina. Mas é tão bizarro... Como se os prédios estivessem se desfazendo e as pessoas perdendo completamente a própria identidade. Da primeira vez que estive lá, em 2004, se falava muito sobre isso, na rua, mas eu pensava que era uma questão de auto-estima. Não é. O que o argentino foi um dia é passado, Buenos Aires guarda muita pouca semelhança com a cidade que era há 15 anos. É como se a história, de alguma forma, tivesse abandonado os planos brilhantes que tinha para este lugar e se esquecido dele.



Uns dias depois, estava empreendendo uma dessas viagens impossíveis pela Zona da Mata mineira. Qualquer pessoa que já tenha visitado essa região sabe do que eu estou falando: impossível chegar em uma cidade a 100km sem passar por todos os pontos de ônibus de todos os municípios, vilarejos, povoados, ao redor -- o que faz que esse trajeto tenha a duração de, aproximadamente, 5 horas, isso se ele for possível. Isso se uma das cidades não estiver alagada. Isso se tiver ônibus.



Encontrando, portanto, paciência em lugares onde anteriormente funcionava o setor da minha vontade de viver, comecei a preguiçosamente prestar atenção na paisagem. Todo caminho era feito em cima, ou em volta, da antiga linha de trem, aquela construída no início do século e depois ampliada, num movimento muito mal planejado que levou ao sucateamento e consequente final da operação ferroviária naquela região e, finalmente, no resto do Brasil.



De repente, aparece uma casinha de madeira na beira do rio (acho que é o rio Muriaé) que diz “esta é a primeira hidroelétrica do Brasil”. Ali, meio no mato, no pé de um riozinho. Não pude evitar pensar o quanto aquela região -- com a linha férrea, com a energia hidroelétrica -- foi planejada para ser o umbigo do mundo, a joia da tecnologia brasileira, assim como Buenos Aires, ou Montevidéu foram planejadas como uma cidade europeia, uma espécie de farol da cultura latino-americana.



Tem um romance de um escritor cubano, António José Ponte, se não me engano, que chama La fiesta vigilada. É sobre Cuba. Na melhor passagem do livro, depois de descrever o processo de censura e ostracismo que sofria na ilha em paralelo com a doença degenerativa da sua avó, ele aproxima as duas imagens. Ele diz que Cuba era o momento em que tinha que bater na avó com uma vassoura para ela parar de defecar pela casa.



Testemunhar a falência de um projeto deve ser então, eu imagino,como fazer parte de um mundo que assiste a uma parte de si ficar senil. E quem é que pode prever isso? Quem é que pode dizer o destino de uma cidade, de uma pessoa, de uma família? Quem sabe quem é que vai e quem fica?

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

sobre fiordes

Terminei de ler, ou melhor, devorar o romance Cordilheira, do Daniel Galera.



O livro faz parte de um projeto chamado Amores Expressos. Projeto bastante controverso, aliás, por causa do uso de recursos públicos e da falta de critério de seleção dos projetos. Apesar de ser da Veja, a polêmica me parece bem resumida na seguinte reportagem, exageros e cinismo à parte: http://veja.abril.com.br/280307/p_113.shtml

Ainda está no ar o site oficial do projeto:http://www.amoresexpressos.com.br/

E o blogue que o Daniel Galera manteve durante a sua estadia em Buenos Aires, com generosíssimos 6 posts:http://blogdodanielgalera.blogspot.com/

Como brinde, um link com a crítica que o Reinaldo Azevedo faz sobre o projeto, demonstrando seus incrível repertório literário: http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/avesso-do-avesso/amores-expressos-o-cinismo-com-mao-de-veludo-da-intelligentsia-brasileira/ .
"Talvez haja um Virgílio ou Horácio entre os viajantes, coisa de que duvido um pouco…", "Quais são os grandes escritores, dramaturgos ou artistas plásticos que marcaram o auge do poder soviético? Inexistem. A arte é uma atividade da vida privada, não do Estado.", etc etc...



Além da discussão do romance por esse lado, o público versus o privado, os limites da lei Rouanet, etc, ficou marcada na minha leitura de Cordilheira a ideia do romance feito por encomenda. Numa entrevista ao Jornal do Brasil, Bernardo Carvalho, autor do segundo volume do projeto, O filho da mãe, respondeu o seguinte:

"– Escrever sob encomenda, como neste caso, tem um peso, é algo construído a despeito de sua vontade. Mas gosto disso. Funciona como uma reportagem, pois serve como pretexto para entrar em contato com outros mundos e personagens, com os quais não teria contato se não fosse por essa via – diz. – A encomenda faz descobrir coisas em seu próprio universo literário. Sendo diferente, o livro reproduz tudo o que sempre quis. E o que sempre quis foi fazer literatura…”


(Tirei de um comentário de um leitor à resenha do Júlio Pimentel Pinto a O filho da mãe: http://paisagensdacritica.wordpress.com/2009/03/16/o-filho-da-mae-de-bernardo-carvalho/)

Sem querer criticar todos os romances sob encomenda do mundo (a Capela Sistina foi feita sob encomenda, afinal), será que a relação com a cidade, no livro do Galera, não é forçada? O que vocês acham?

Fiz um levantamento e descobri 10 erros de espanhol e 3 problemas linguísticos idiossincráticos (como o uso do "tú" por um argentino, algo altamente improvável), o que significa, pelo menos, que o autor não se deu ao trabalho de procurar as palavras estrangeiras no dicionário, e também, talvez ainda mais grave, que com todo o dinheiro disponibilizado para o projeto, a Companhia da Letras (que não é nenhuma editora pé de esquina) não achou importante contratar um revisor habilitado em espanhol. (Fico pensando como deve ter sido a revisão do russo, do chinês...). A viagem terá sido mesmo um apêndice? O projeto não leva a si mesmo a sério?

No mais, acho que tudo isso ainda não faz do livro uma obra ruim em si. Na verdade, gostei muito de lê-lo -- só para não desanimar ninguém. Ultimamente, ler um livro brasileiro escrito por um homem com uma protagonista feminina já parece um ponto positivo. Acho que com protagonista feminina em geral, Regina Delcastagnè me corrija, já que existe uma tradição bizarra de narradores masculinos mau-caráter -- herança maldita de Machado de Assis?

De forma geral, gostei muito da Anita van der Goltz Vianna, a narradora (fora o nome, talvez). No começo, ela parece uma personagem muito forte, decidida, o que não costuma a ser a opinião geral sobre as mulheres no mundo ficcional ou real. O fato de ela estar em crise com o ofício de ser escritora, de renegar seu livro como algo tão distante que ela já não lembra mais e de agir de forma absolutamente humana (folhear o próprio livro no avião para se lembrar, estranhar as diferenças culturais em uma cidade estrangeira, se atrapalhar nas relações com as pessoas, fazer as coisas sem saber por que) sem por isso ser ridícula, faz dela uma personagem mais do que verossímil. Uma personagem sólida, estável, interessante, diferente da tendência à tipificação, preferida por escritores da linha Fonseca, da qual o Galera, a princípio, parecia fazer parte.

Os personagens secundários é que são o problema. Eles são só interessantes no enredo pelo que fazem, não pelo que são. E aí resulta que eles não são muito. O Holden era um que tinha bastante potencial. Parecia se encaixar na fantasia de Anita a respeito de Buenos Aires:
"Os argentinos se reproduzem por osmose, garantiam meus amigos que já tinham passado pela excruciante experiência de tentar seduzir uma argentina. Volta e meia eu trazia essa teoria à mente apenas para tentar afugentar a imagem que me perseguiu durante todo o vôo para Buenos Aires, a de um homem meio narigudo, magro e atlético, com corte de cabelo estilo mullet, a barba por fazer, cheirando a cigarro, sussurrando seu belo casaco de lã imitado de alguma grife nova-iorquina para então montar em cima de mim e meter com força até esporrear o colo do meu útero e então desaparecer da minha vida" (p. 15)


E, é claro que, fora o sexo, a coisa não vai bem assim. Mas a relação de Holden e Anita, os laços emocionais ou não, íntimos ou não, começam a perder espaço, página a página, para uma história de teoria da conspiração que não é, para nada, interessante. O mesmo a respeito da relação da protagonista com o ex namorado, Danilo, figura importantíssima na vida dela por tê-la "adotado" depois que o pai morreu. Largar Danilo parece ter sido uma coisa fácil, mediante a negativa dele de ter filhos. Fico pensando que talvez corresponda àquele momento de liberdade que sentimos logo depois de nos distanciarmos de alguém com quem vivemos muito tempo. Mas e a solidão de uma cidade estranha? Galera esboça isso algumas vezes, nas conversas por telefone no locutorio, mas não desenvolve. Acho que a coisa fica superficial mesmo, porque o ponto fraco do escritor parece exatamente os diálogos. Não sei se de repente porque ele está num momento de transição de estilo -- pelo menos pelo que lembro, na sua fase mais Rubem Fonseca, ele tinha uma concisão irritante --, com uma influência clara de escritores de língua espanhola contemporâneos, cuja narrativa é segura e elaborada. Ele os coloca na mão inclusive de sua personagem (Roberto Bolaño, no caso, mas pensei também em um Villa-Matas, um Bellatín).

Acho que esse estilo em trasição também faz uma confusão com os registros. Na narração, alternam-se momentos mais "informais", em que a leitura é mais fluida: "Não trepar era sinônimo de estar feia..." (p. 19). E, no decorrer do romance, a norma volta com tudo, em frases que cultivam o prétérito mais que perfeito, a ênclise e demais recursos quase extintos do português. Algumas frases ficam bizarras:
"Foi a última da turma a brotar peitinhos e quadris, mas quando botou corpo se transformou num mulherão de curvas quintessenciais com um metro e setenta e sete de altura, cabelos loiros translúcidos como fios de náilon e um rosto delicado de nariz e queixo pequenininhos, uma potranca com rosto de francesinha" (p. 18)
que só poderia ter sido dita por um homem. E um homem pedante. Tudo bem, me lembro de quando as minhas amigas começaram a ter peito (quem teve primeiro, quem tinha mais, quem usava sutiã), mas quadril? Além disso, quem chama a amiga, no auge do culto às mulheres fruta, de "potranca"? Mas o que chama mesmo a atenção são as "curvas quintessenciais", expressão que denota desejo e também o mau hábito da escrita empolada.

Esse traço, a meu ver, põe a perder momentos decisivos, como o final do livro. A cena se passa entre os dois ex amantes, Danilo e Anita, depois de algum tempo de revival que precede a volta da protagonista ao Brasil. Desnecessariamente, conversam no terraço do prédio, num movimento romântico pouco verossímil, já que, sinceramente, poucas vezes em São Paulo o clima tornaria confortável um encontro num terraço. A conversa é altamente piegas, sobre uma palavra indígena que significa "o olhar que duas pessoas trocam quando cada uma fica esperando que a outra inicie uma coisa que as duas querem, mas que nenhuma tem coragem de começar" (p. 175). Primeiro, a afetação é algo alienígena no livro. Em nenhum momento, ou em poucos momentos, as personagens são arrebatadas pelo desejo de dizer, liricamente, o que estão sentindo. Segundo, a linguagem enciclopédica, que realmente não combina com o momento. A ideia é que Anita esteja sendo sincera, honesta, desabrida. Não faz sentido que o registro seja tão formal, o que a distancia do leitor, de Danilo e, mais importante, daquilo que ela está dizendo.

Acho que o que Galera ensaia neste livro é exatamente isso, a sinceridade. Sobre quem somos -- como geração mesmo --, o que pensamos e como vivemos. Sobre nossos sentimentos, apesar da pressão para que o escritor seja, exatamente, quintessencial, importante, sociólogo, algum tipo de autoridade legitimada sobre as coisas da vida. Contra tudo isso, Galera escreve com uma simplicidade impressionante, emocionante, envolvente e sincera. Acho que no que diz respeito ao estilo, ainda está tateando as melhores formas de fazê-lo, com resultados muitas vezes bastante positivos.

"...ali pelos vinte anos comecei a escrever um romance que era um pouco sobre mim, um pouco sobre minha mãe como eu a imaginava e outro tanto sobre ninguém em especial, apenas uma tentativa de afirmar que eu podia criar por conta própria o tipo de ficção que tinha um papel tão importante na minha vida, o tipo de ficção que havia encantado uma mãe e uma filha e criado um vínculo entre elas..." (p. 175)


PS: desculpem pelos links-sem-links, mas o blogger deu pau.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

dia do livro!




hoje é o dia mundial do livro, este é um blogue mais ou menos sobre livro, e neste dia gostaria de confessar que sou uma orgulhosa dona de um kindle.

não, o kindle não é um tablet, um computador de mão: ele não serve para entrar na internet e a tela dele não é feita de sei-lá-o-que as telas dos computadores são feitas, mas de um cristal líquido que não emite luz própria. assim, nada de olhos cansados!

o formato de arquivo do kindle é o mobi, preferencialmente, mas você pode converter arquivos em pdf, em doc ou mesmo em html para este formato e, uma vez lendo, pode mandar a letra aumentar ou diminuir, aumentar a margem, aumentar o espaçamento e até mandar uma voz sexy ler o livro pra você.

além disso, o kindle é muito mais barato que um tablet e não te desconcentra com bobagens, tipo posts de blogues estúpidos.

dá também pra baixar um monte de coisa 0800 por aí. um dos meus sites preferidos é este, mas uma pesquisa no google não mata ninguém.

a grande desvantagem é que o aparelho é preto e branco, e assim você não pode visualizar bem imagens em geral, sem contar que tem uma tela pequenininha...

dá pra assinar jornais e comprar muitos livros baratinhos na amazon, que chegam na mesma hora pra você por satélite.

acho que a melhor parte é que não pesa, não pega poeira, não amassa. dá para riscar, anotar, compartilhar sem problemas e nenhuma árvore morreu por causa dos meus desejos incontroláveis de CULTURA!! bwhahhahaha!

brincadeira. não sou geek maníaca, não estou nem aí pra tecnologia, mas confesso que o kindle me deixa mais animada. imagina? não precisa imprimir nada! se você tá a fim de ler um livro que demoraria 3 semanas pra chegar dos EUA, pode comprá-lo em dois segundos, ou baixá-lo e lê-lo confortavelmente, imediatamente.

desculpa a propaganda babaca: este post está sendo inteiramente ditado pela minha coluna satisfeita de não ter que carregar tanto livro pesado para a faculdade. NUNCA MAIS!

terça-feira, 19 de julho de 2011

um post por dia

ÃS VEZES eu fico pensando que o nonsense não é uma coisa bem apreciada. se tivéssemos agora um concurso de poesia, duvido que aquela que não tivesse um propósito específico, uma agenda, uma força organizadora e explicativa poderia ganhar o prêmio.

e também porque o nonsense envolve algum humor. e tem que ser sempre despretencioso e escritor despretencioso é uma safra que não nos dá o ar da graça há bastante tempo. no fundo, como diria leyla perrone-moisés: "Foi somente a partir do romantismo que ela [a literatura] passou a ter o sentido que, em parte, tem ainda hoje: textos escritos numa linguagem particular, que interrogam e desvendam o homem e o mundo de maneira aprofundada, complexa, surpreendente.".

eu tenho medo de uma literatura que desvende o homem /reginaduarte. Que desvende o mundo. é como se a literatura fosse o manual didático da existência na terra, quando, na maior parte das vezes ela é complicada, ambígua, moralmente estranha.

e viva a estranheza, viva as coisas que a gente não entende, mas que de alguma maneira mágica conseguimos dialogar, manipular, confeccionar. viva o nonsense.

terça-feira, 17 de maio de 2011

mais um drama russo?


FALANDO EM infâmia, o mote secreto deste blogue, lendo a edição de 4 de maio da revista Carta Capital, eis que me defronto com a coluna "blogs do além", que pode ser uma das melhores coisas que o jornalismo brasileiro já criou. seguramente a mais infame.

o blogue do mês é tolstoy story, o blog de liev. não me lembro do dia em que ri tanto sozinha.

segundo o romancista russo, recém tirado da cova
Pegue o último Oscar e faça um exame sincero. Quem apresenta uma abordagem mais profunda e reflexiva sobre a vida? O oscarizado e previsível O Discurso do Rei ou o comovente e surpreendente Toy Story 3?”, provoca Liev. “De minha parte não há dúvida. Se algum produtor desses grandes estúdios de animação se interessar em adaptar meus escritos tardios, tudo o que eu tenho a dizer a ele é: amigo estou aqui.