quinta-feira, 9 de novembro de 2006

borges: humor

A primeira imagem que Borges passa - o Borges, o Jorge Luís, o homem, o cara - é aquela carona intelectualóide preto e branca da famosa entrevista, aquela. O senhor cego, meio torto, pouco argentino já nos seus oitenta e muitos anos, com concepções políticas duvidosas.
Nada disso é mentira.
Sua extensa obra circunda temas - e circundar é uma palavra cuidadosa- circunda certos temas que não são superados, mostrando um escritor que amadurece, mas tratados e re-tratados infinitamente e, por isso, mitologicamente. Sua obra é uma mitologia pessoal.
(Esta não é a introdução de um trabalho acadêmico, me desculpem o pedantismo. Sim, todos conhecem Borges - o Borges, o homem, o cara, aquele - e eu não preciso apresentá-lo. Tudo isso, eu juro!, era pra dizer o que segue...)
Borges, o Borges, também é engraçado. Oligofrenicamente engraçado.

A trama (livre tradução)

Para que seu horror seja perfeito, César, encurralado ao pé de uma estátua pelos impacientes punhais de seus amigos, descobre entre as caras e os aços a de Marco Júnio Brutus, seu protegido, talvez seu filho, e já não se defende e exclama: Tu também, filho meu! Shakespeare e Quevedo recolhem o patético grito.
Agradam ao destino as repetições, as variantes, as simetrias; nove séculos depois, ao sul da província de Buenos Aires, um gaucho é agredido por outros gauchos e, ao cair, reconhece um afilhado seu e lhe diz, com mansa advertência e lenta surpresa (estas palavras devem ser ouvidas, não lidas): Mas, che! Matam-no e não sabe que morre para que se repita uma cena.

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