domingo, 10 de abril de 2011

silêncio. cadeiras ao contrário.

Silêncio.

O público está disposto em cadeiras quadriculadas, formando um quadrado de proporções áureas.

abre a cortina.

bom dia. hoje, senhores, todos vocês foram vacinados contra o lirismo. se alguém for pedante aqui neste palco, vocês não ouvirão. haverá uma pausa dramática, ou o barulho de um rojão, dependendo do metabolismo de cada um.

(mulher): é difícil escrever uma história com "nós". há o sol, há um negócio cinza que aqui em são paulo chamamos de... "céu". há o mar, que existe só no pensamento. e existe eu.

bom dia. hoje, senhoras, vocês foram vacinadas contra uma coisa muito especial, que se chama amor. se alguém sentir algo parecido com uma calentação dos sentidos, uma falha na apatia geral que comanda nossas vidas, esta pessoa sofrerá combustão espontânea. e isso é bom, porque dentro de instantes ficaremos sem luz.

(apaga a luz)

(labareda) eu uma vez quis atravessar à noite um rio. vocês sabem como os rios são, intempestivos. eu fiz como os ginastas, aquela pose, enchi a mão de talco e pulei. o rio pegou fogo. um rio pegando fogo será a personificação absoluta de uma palavra chamada arrependimento.

(mulher) teatro é como cinema três dê. mas não é. porque os atores gritam e têm essa dicção absolutamente artificial. nunca queiram ser atrizes, meninas, porque nunca mais vão conseguir reconhecer uma voz verdadeira.